10/07/2020
Por Anaïs Fernandes, Valor — São Paulo
Melhor política contra desigualdade é a urbana, diz Yang, do Instituto Urbem
A pandemia não só agrava a desigualdade, como traz à vista o "fosso enorme" que existe entre ricos e pobres, afirma Philip Yang, fundador do Instituto Urbem (Instituto de Urbanismo e Estudos para a Metrópole), para quem "a melhor política contra desigualdade é a política urbana".
Para Yang, entrevistado na Live do Valor desta sexta-feira, o maior fator de risco para a morte por covid-19 não é uma condição biológica, mas uma condição social. “E essa condição social é, antes de mais nada, também uma condição territorial, porque a população de risco é quem ganha pouco e está em situação de moradia vulnerável”, afirma.
Por isso, Yang repete seu "mantra": "A melhor política contra a desigualdade é a política urbana." Para ele, essa é a maneira de corrigir “grandes flagelos”, que seriam as dificuldades de acesso a bens coletivos (transporte, habitação, saneamento etc). "Quando você aplica uma política urbana muito vigorosa, no mesmo nível de força que tem uma política econômica, você consegue corrigir esses efeitos nefastos que a desigualdade carrega", afirma Yang.
Com a pandemia, porém, todas as esferas de governo enfrentarão uma restrição fiscal grande, o que impõe sacrifícios e desafios aos programas habitacionais, segundo Yang, que se diz "muito preocupado com 2022", ano da próxima eleição presidencial.
"Esse governo federal entrou sem nenhuma ideia do que seria a política habitacional e herdou as políticas habitacionais de outras administrações. Os recursos estão cada vez mais escassos, os orçamentários, do FGTS etc. A política habitacional demanda uma modelagem que é bastante complexa, não se faz em questão de meses, demora um ano, dois anos, envolve a mobilização das melhores inteligências", diz Yang.
Para ele, é necessário pensar uma política habitacional que não repita os erros do passado. "O Minha Casa Minha Vida, depois de dez anos e R$ 450 bilhões de recursos alocados no programa, não diminuiu o déficit habitacional, gerou 'cidades-monstro', produziu casas onde as pessoas não têm farmácia, mercearia, creches ou postos de saúde. São distopias urbanas que criamos", afirma. "Lógico que é melhor isso do que sem isso, esse é o argumento das pessoas que estão no ciclo de interesse. Mas o desenho dessa política cometeu muitos equívocos e temos que evitar isso nas próximas políticas habitacionais", acrescenta.
Yang observa ainda que uma característica preocupante do Brasil é que o Estado, em geral, exerce de maneira precária sua soberania em áreas centrais e periféricas. Segundo ele, é uma impressão de que "o caos está invadindo a ordem". "É um processo que a gente precisa reverter e, inclusive, do ponto de vista da urbanização, do espraiamento urbano", ele diz.
Se “aglomerar” tem sido muito perigoso no curto prazo, por causa da pandemia, "desaglomerar é muito perigoso no longo prazo", afirma Yang, referindo-se ao avanço das manchas urbanas. "Isso é muito perigoso do ponto de vista de equilíbrio ecológico. Você está gerando fricção do meio urbano com áreas de proteção e preservação ambiental, áreas de produção agrícola."