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PPP de habitação propõe reocupação mista do centro de SP

05/04/2013 | 08h37
Por Guilherme Soares Dias

 

Ipiranga com São João. Marco da cidade de São Paulo, o entorno do cruzamento das avenidas que se tornaram o símbolo da pujança da cidade nas décadas de 60 e 70 - e inspiraram "Sampa", uma das mais famosas canções sobre a capital paulista -, deu lugar hoje a um cenário de degradação e imóveis considerados subaproveitados.

 

A área é um dos alvos de uma Parceria Público-Privada (PPP) para a construção de 20,2 mil unidades habitacionais. O projeto do governo do Estado de São Paulo, em parceria com a prefeitura paulistana, é uma tentativa de trazer novos moradores para o centro da cidade, que perdeu quase 100 mil habitantes nos últimos 30 anos.

 

Além da migração, a região abriga galpões, antigas fábricas abandonadas, terrenos baldios e prédios sem ocupação que, agora, devem se transformar em condomínios que abrigarão, no mesmo espaço, comércio e residências para pessoas de baixa e média renda. A reocupação do centro está baseada em um modelo de "ocupação mista". Além de misturar comércio e residências no mesmo prédio, famílias com renda até três salários mínimos, e outras com até 16 mínimos de renda familiar, partilharão o mesmo condomínio.

 

A ação é pioneira e terá o desafio de viabilizar a primeira PPP habitacional do país, em uma região que recebeu, nos últimos dez anos, apenas 7 mil moradias construídas pelo poder público. Coordenado pela Casa Paulista, agência de fomento de habitação social do Estado, o projeto custará R$ 4,6 bilhões, sendo R$ 2,6 bilhões da iniciativa privada, R$ 1,6 bilhão do governo do Estado e R$ 404 milhões da prefeitura de São Paulo.

 

A intenção, segundo o secretário estadual de Habitação, Silvio Torres, é induzir a ocupação do centro e fazer com que outras empresas invistam no entorno dos imóveis que serão construídos ou reformados. "Em breve o centro terá novos moradores. Estamos incentivando a construção para a baixa renda, já que outras faixas conseguem ter acesso à região", diz o secretário.

 

A subprefeitura da Sé concentra 17% dos empregos de São Paulo e apenas 3% dos moradores da cidade, o que justifica a "necessidade de ocupação" da região, diz Torres. A maior parte das intervenções será feita ao longo de linhas de trem existentes na região e de grandes avenidas centrais, que, no passado abrigaram fábricas. Desativadas, deixaram espaços vazios ou subutilizados.

 

A administração municipal pegou "carona" na PPP habitacional após o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), abandonar o projeto Nova Luz, elaborado pelo ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), que previa intervenção na região de Santa Ifigênia por meio de concessão de espaços para empresas.

 

O quadrilátero que seria atendido pelo Nova Luz não fazia parte dos estudos pedidos pelo governo do Estado para a PPP da habitação, já que seriam atendidos pelo projeto da prefeitura. A alteração deve vir no período de consulta pública, quando a nova administração municipal pedirá a inclusão da área, segundo o subsecretário da Casa Paulista, Reinaldo Iapequino.

 

A partir da publicação do edital do projeto, previsto para as próximas semanas, o processo de desapropriação dos imóveis já deve ser adiantado pelo governo do Estado para tentar acelerar a construção das novas moradias.

 

Dessa forma, em outubro, quando está prevista a assinatura do contrato com a empresa vencedora, algumas obras já poderão ser iniciadas. Segundo o projeto, os imóveis devem ser finalizados entre dois e seis anos. Cerca de 95% dos empreendimentos serão construídos em Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis), definidas no Plano Diretor de São Paulo elaborado em 2002.

 

Hoje, a PPP habitacional será discutida no Arq.Futuro, fórum sobre arquitetura e urbanismo, com a presença do prefeito de São Paulo e do governador Geraldo Alckmin (PSDB). "Esse projeto será um marco no desenvolvimento da capital paulista, um grande passo na construção de uma cidade múltipla, democrática e inclusiva, e um modelo a ser adaptado e replicado no país", afirma Marisa Moreira Salles, proprietária da editora BEI, que organiza o evento.

 

Das 20,2 mil unidades previstas, 12,5 mil serão destinadas para quem tem renda familiar bruta mensal de até seis salários mínimos (R$ 4.068), Desse total, 2 mil unidades serão direcionadas para pessoas atendidas por entidades com atuação no centro e já cadastradas. O valor da prestação nesse caso deve variar de R$ 151 a R$ 302. As demais unidades serão para famílias com renda até 16 salários mínimos (R$ 10,8 mil).

 

"A prioridade será dada a pessoas que trabalham no centro e moram em outras regiões. Estamos seguindo a política do plano diretor, de investir em moradias onde já há equipamentos urbanos", afirma Torres. Mesmo com o terreno mais caro, o investimento em habitação no centro sai três vezes mais barato que em regiões periféricas, já que o desembolso para construir novos equipamentos públicos são bem menores.

 

Para o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Mello Franco, o principal motor de desenvolvimento do centro passa por um programa de "repovoamento" da região, uma vez que a tentativa de fazê-lo pela criação de "âncoras culturais", como a Sala São Paulo, Pinacoteca e Museu da Língua Portuguesa, não foram eficientes para mudar o entorno. "O principal elemento de segurança, não é a câmera, nem a polícia, é o ambiente urbano. Para isso, queremos incentivar o repovoamento do centro", disse o secretário. "A PPP é pouco para a metrópole, mas muito para a história de habitação de interesse social. O modelo será testado, e se der certo há possibilidade de ampliá-lo."

 

O estudo de PPP escolhido foi o do Instituto Urbem. "É uma equação nova, com mix de renda no residencial, além do uso comercial, característico do centro", explica o arquiteto José Armênio Brito Cruz, que participou da equipe que elaborou o projeto. Segundo ele, o modelo atende à demanda de pessoas querendo morar no centro, e à necessidade de ocupação de terrenos subaproveitados. "Traz de volta pessoas para o centro. Essa nova população vai provocar mudanças, melhorias nos equipamentos públicos e reativação do comércio", afirma Cruz.

 

Para João Sette Whitaker, professor de arquitetura da USP e do Mackenzie, a PPP é "mais bem-intencionada " do que o Nova Luz, mas está sujeita à valorização das áreas. "O projeto mexe com questão fundiária, está sujeito à dinâmica de altas no mercado", diz, citando um dos possíveis empecilhos para a execução da proposta.

 

Sette diz que a recuperação da área central se dá por uma equação que garanta uso comercial e residencial para faixa de renda média. "Isso nunca foi feito de maneira prioritária pelo poder público", afirma. Segundo o professor, a proposta ainda atende número limitado de pessoas de baixa renda. "A política tem que ser a mais democratizante possível e deve incluir população de mais baixa renda", diz. Dos 20 mil imóveis, cerca de 3,2 mil serão destinados a pessoas que ganham até três mínimos, além das 2 mil ligadas a entidades assistenciais. "É muito pouco, já que 40% da população de São Paulo está nessa faixa", diz.

 

O conceito de comércio no térreo e uso residencial nos andares superiores também é considerado ideal para a região por Claudio Bernardes, presidente do Secovi-SP. "Minha preocupação é usar o centro para resolver moradia de baixa renda. A revitalização da região deve ocorrer com espectro amplo, com diversas características, rendas e inclusão do lazer", diz o executivo.

 

O presidente do Secovi afirma ainda que as diferentes faixas de renda têm nível de aproximação pequena. "É difícil misturar faixa salarial de até três salários mínimos com o de mais alto padrão no mesmo condomínio. As pessoas com renda mais baixa não conseguem pagar por aquilo que os de renda mais alta querem."

 

Franco, o secretário de Desenvolvimento Urbano, cita o Copan, prédio construído na década de 50, localizado no centro e projetado por Oscar Niemeyer, que conta com 5 mil moradores e 1.160 apartamentos, com dimensões que vão de 26 metros quadrados até 219 metros quadrados. "Promover esse mix social é positivo", diz. (Colaborou Robinson Borges)

 

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